domingo, 24 de abril de 2011

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Por: Margot Cardoso
Saiba como é o funcionamento do seu cérebro (mecanismos da vontade e do pensamento) e, a partir deste conhecimento, aproveite todas as suas potencialidades, ultrapasse seus limites e seja muito melhor como pessoa, como profissional e como espécie.
Já foi extensamente alardeado o fato de o homem usar pouco e de forma limitada o seu cérebro. O fenômeno pode ser explicado por fatores que vão desde dificuldades biológicas, modelos culturais castradores, até falta de conhecimento. Mas o principal deles é a pouca informação sobre seu funcionamento. Como conseguir fazer tudo que tenho vontade? Por que não consigo implementar ações? Por que não sou criativo?
Como é sabido, o primeiro passo para transformar e desenvolver o que quer que seja é conhecer seus mecanismos de funcionamento. Este método vale para tudo e, principalmente, vale quando se trata de melhorar a performance da nossa massa cinzenta.

Eu conheço, eu mudo
Supremo orgulho da nossa espécie, o cérebro é uma fantástica máquina que pesa cerca de 1,4kg, comporta mais de 12 trilhões de neurônios e está dividido em três partes fundamentais: o hipotálamo, o sistema límbico e o córtex.
O hipotálamo é um pequeno órgão, existente na base do crânio, que controla as funções de sobrevivência. Ali reside o centro da fome, da saciedade, da sede, do impulso sexual. Fundamental, visto que sobreviver é o interesse primeiro de qualquer ser vivo, o hipotálamo não é exclusivo da raça humana: o do réptil, por exemplo, é muito similar ao nosso, por isso é que o hipotálamo também é chamado de cérebro reptiliano.

Já o sistema límbico tem a função de prover o indivíduo de emoções. Aqui é a casa dos sentimentos. Alguns mamíferos, como o cão e o gato doméstico, também possuem o sistema límbico.
E, finalmente, o córtex, exclusivíssimo da espécie humana, responsável por três tarefas: o controle dos movimentos do corpo, a percepção dos sentidos (visão, tato, olfato, audição e gustação) e o pensamento. Você já ouviu falar dos famosos hemisférios direito e esquerdo? Pois é. É aqui, no córtex, que eles vivem. Esta porção também é sinônimo de inteligência, razão e espírito e protagonista-mor dos grandes vôos do pensamento humano, como as revoluções e as descobertas.
Cada um de nós é uma personalidade um pouco esquizofrênica, tragicamente dividida contra si mesma. Martin Luther King

O assombroso - e também motivo de toda confusão e complexidade - é que os três existem e se manifestam simultaneamente dentro da cabeça de cada um de nós. Mas, de acordo com o médico e biólogo Eugênio Mussak, autor do livro Cérebro de Estudante, a existência dos ‘três cérebros’ não é contraditória. Eugênio, que tem como foco de trabalho a mudança do comportamento humano, afirma que eles são complementares.
“No entanto, é necessário que entre eles exista hierarquia e,fundamentalmente, o conceito de hora e local, já que cada um tem uma função vital para executar de acordo com a necessidade”.
Pronto! Eis o início da dura realidade. Eles ‘podem’ ser complementares! E aqui a sua parte: dependem de você. A convivência dos três cérebros pode ser complementar, se bem conduzidos. E esta arte de bem conduzi-los também recebe o nome da arte de viver, de sucesso, de equilíbrio, de saúde. O oposto - a falta de habilidade para orquestrá-los - costuma atender pelo nome de conflito interior, de fracasso.
No meio do inverno, eu finalmente descobri que existe em mim uma primavera invencível. Albert Camus

Chegamos à nossa pedra fundamental. Como construir o equilíbrio perfeito entre eles? Qual é o que exige mais investimentos? Qual deles temos a capacidade de mudar, de aprimorar? “O córtex”, responde Eugênio. De acordo com ele, o córtex é o mais recente do ponto de vista da existência biológica. Por ser ainda recente na espécie humana, o homem ainda não aprendeu a usá-lo em sua capacidade máxima. E pior: o não usar acaba por enfraquecê-lo e atrofiá-lo.
Não é exagero dizer que a base dos grandes problemas que o ser humano tem hoje é a falta de habilidade para lidar com o cérebro.
Um dos exercícios mentais que contribuem para elucidar a tomada de decisões e posicionamentos é você aprender a identificar de onde vem a fumaça, isto é, qual porção do seu cérebro está se manifestando (este discernimento também atende pelo nome de autoconhecimento). Vamos aos exemplos:
- Você passou por uma grande desilusão amorosa e afundou-se na tristeza, não foi capaz de reagir, o projeto em cuja frente você estava, ruiu. Na empresa, você acabou ganhando o rótulo de fraco, de desequilibrado e foi colocado de lado. O que aconteceu? O sistema límbico tomou conta de tudo e fez o que bem quis, e o seu fraco córtex - que não foi devidamente alimentado por você - ficou lá, apático, exaurido.
- Você não consegue engatilhar um único relacionamento. Está sempre com duas namoradas, sempre arrumando encrenca porque, simplesmente, não tem jeito: você não resiste às mulheres. É o seu hipotálamo no comando.
- O médico diz que você precisa fazer atividade física. O seu córtex tem relacionado todos os benefícios de uma vida saudável e... Não adianta: você tem uma preguiça gigante, dominadora. Seu hipotálamo é poderoso. É ele quem manda.
Antes que sua auto-estima comece a declinar, saiba que grandes exemplares da espécie, como o sábio apóstolo Paulo, também se debatiam com suas contradições internas. “O bem que sei que é o melhor não consigo implementar. E o mal, deste, não consigo me livrar”.
Cavalgando o leãoTodas as coisas estão prontas se a nossa mente também estiver. William ShakespeareQuando se diz que alguém é bem-sucedido, é comum destacar o empenho, o otimismo, a abnegação, o caráter persistente, o brilhantismo... Quando encontramos uma pessoa de bem com a vida, cultivadora de excelentes relacionamentos, feliz com ela mesma, costumamos defini-la como “bem-resolvida”. A tradução cerebral disso é que há um perfeito equilíbrio em tudo o que se passa interiormente nela. Há todos os indícios de que o ‘bem-sucedido’ é o feliz proprietário de um córtex ativo. Lá está ele, de batuta na mão, orquestrando todos os interesses. 

Força serena
Aqui um alerta: é preciso deixar claro que o córtex não pode ser um aniquilador, um ditador, mas um regente que aponta a melhor hora para uma explosão de raiva, a melhor hora para o descanso. Porque o sistema límbico e o hipotálamo também precisam ser atendidos. Atendidos?

Claro! E por razões óbvias. Se você não se alimenta corretamente, não dorme o suficiente, há um desequilíbrio de todas as funções do seu organismo e aí vêm as doenças. Se você não dá vazão a seus sentimentos, não se permite, vem a frustração, os traumas, a baixa auto-estima.

Deve-se estar atento a que o córtex esteja no comando, negociando, fazendo parcerias, com lucidez, com sabedoria, exatamente como deve ser o bom líder. Já imaginou os estragos de uma liderança limitada, obtusa e ditadora?
Mas como conseguir isso? É possível instruir o córtex? Grande notícia: sim. O cérebro humano é o órgão mais treinável do corpo. O pensador francês Jean-Paul Sartre costumava dizer, com muita propriedade, que o homem pode ser o que ele quiser, até ser um creme podre, só depende dele. As capacidades de raciocínio, de planejamento, de criar, de harmonizar... Qualquer qualidade ou aptidão que você imaginar, o seu cérebro é capaz de executar e executar cada vez melhor. Basta que você o treine.
Porém - atenção ao perigo maior - o cérebro obedece a uma das grandes leis da biologia: a lei do uso e desuso. “Usou, desenvolve; não usou, atrofia. É uma lei que vale para músculos, tendões, ligamentos, ossos e também, ou principalmente, para o cérebro”, explica Eugênio.
Verdade científica
Há muito que os cientistas descobriram que é possível aumentar o número de sinapses, que são as ligações que existem entre os neurônios. Quanto mais informação e conhecimento, mais sinapses vão se formando, porque as células nervosas não trabalham isoladas, dependem da rede a que pertencem. E, quanto mais ligados entre si os neurônios estiverem, melhor será o desempenho das funções cerebrais.
Na prática funciona da seguinte forma: quanto maior o conhecimento de uma pessoa e sua diversidade de interesses, maior é o número de sinapses. E, neste caso, quantidade é qualidade: “O aumento das sinapses melhora o raciocínio e a memória, pois há um incremento da velocidade da transmissão de informações entre os neurônios”. É o mesmo raciocínio de estradas e ruas, quanto mais vias de acesso, maior a possibilidade de atalhos e rapidez de deslocamento.
Até bem pouco tempo, acreditava-se que era possível aumentar apenas o número de sinapses. Porém estudos recentes atestam que é possível aumentar o número de neurônios que possuímos: cientistas conseguiram provocar a proliferação de células nervosas no cérebro de ratos submetidos a estímulos cerebrais e a exercícios físicos. A partir desta informação, a conclusão óbvia é que o desenvolvimento do cérebro humano é ilimitado. 

Cérebro na sala de aula
Como se treina? Onde se treina? Existe curso para isto? O treinamento cerebral é simples e pode ser ministrado no dia-a-dia, em qualquer hora e lugar. Semanticamente falando, é a mesma metodologia e filosofia da prática esportiva: o segredo é tomar gosto pela prática, acostumar-se com a constância.
Este é o primeiro passo. Prepare seu espírito - e sua agenda - para a prática obstinada.
Eugenio cita o exemplo do nadador: “Quem faz natação prepara-se durante meses para uma competição. O tempo e a constância não são discutidos. O que importa é o treino em si: melhorar a cada dia, baixar os próprios tempos, aprimorar as largadas, as braçadas e as viradas. Enquanto isso, o corpo vai melhorando, ficando mais forte, mais musculoso, mais magro”, explica ele. É este o primeiro comportamento que você deve incorporar: a constância e a disciplina dos atletas, características fundamentais para a conquista da alta performance cerebral. 


Você é único!
A primeira tarefa é aprofundar o conhecimento sobre você mesmo. Eis aqui uma aventura fantástica, porque você é único. Uma curiosidade: a grafologia, que muitas empresas estão usando no processo seletivo, tem como princípio esta unidade cerebral. “O ato de escrever é fruto de um comando cerebral.
O cérebro humano é único, portanto a letra também. Os grafólogos a usam como ferramenta para o entendimento do indivíduo”, explica a professora Maria Inês Felippe, psicóloga, mestre em criatividade e consultora de Recursos Humanos.
Não há um modelo igual a você para que você faça estudos comparativos, não existe um registro histórico de uma pessoa exatamente como você que possa guiá-lo. O que você pode é buscar ferramentas de apoio. E o mundo está cheio delas: livros, trocas de experiências com outras pessoas, filmes, terapias e até esta reportagem.
O ideal é que você comece com os conhecimentos básicos sobre você e depois vá se aprofundando. O nível básico deste conhecimento é primeiro definir qual é o departamento em que você é melhor.
Voltemos ao cérebro. Estudos apontam que o córtex está dividido entre hemisfério direito e hemisfério esquerdo. Você já deve ter ouvido falar disto. Quando se trata de controle dos movimentos do corpo e da percepção dos sentidos (lembra que o córtex também é responsável por isto?), eles dividem igualmente as tarefas: o funcionamento é contralateral, o lado direito controla o lado esquerdo do corpo e o esquerdo, o lado direito.
Porém, esta ‘simplicidade’ não se aplica quando se trata do pensamento, e estudos científicos apontam uma predominância de um dos lados, que se reflete na personalidade do indivíduo.
O esquerdo executa um pensamento com tendências à lógica, à matemática, à organização, ao planejamento. O hemisfério direito é criativo, romântico, sonhador, visionário.
Alguns atribuem o predomínio de um dos hemisférios à escolha profissional. Faz sentido, porque um engenheiro, por exemplo, lida com cálculos, com planejamento. E se ele estudou estas disciplinas é natural que o seu lado esquerdo tenha se desenvolvido mais. Assim como o artista, que atua com a intuição, a imaginação, a estética, desenvolveu mais o seu lado direito.
“Claro que este raciocínio está certo, pois o pensamento é como um músculo, pode ser treinado. Mas também não podemos desconsiderar as tendências naturais. É possível que estes profissionais tenham escolhido a sua profissão porque já se davam conta do predomínio de determinado hemisfério”, argumenta Eugenio Mussak.
Qual dos dois hemisférios tem mais chance de se dar bem no mundo? Os dois têm chances iguais e o mercado de trabalho e o mundo precisam dos dois tipos. Porém é cada vez mais notório que o ideal é ter um equilíbrio entre os dois. (Faça a avaliação no quadro ao lado para verificar qual o seu lado predominante.)
Atuando com os dois
Como se sabe que há um desequilíbrio entre os lados? É perceptível na prática? É. Exemplos: você é muito criativo e cheio de idéias (predomínio do lado direito), porém, quando chega à etapa de implementar, de pôr em prática, você emperra (lado esquerdo pouco desenvolvido). Ou o oposto: você só sabe executar, criar não é com você.
Tudo bem. Não dá para ser bom em tudo. É por isso que o trabalho em equipe existe. Um cria, outro planeja, outro executa. Infelizmente, este tipo de acomodação não justifica e pode ser mortal para certos profissionais. O advogado, por exemplo, precisa de raciocínio lógico. Como ele defenderá o seu cliente sem organizar todas as informações de forma clara e objetiva? Sem contar que este equilíbrio entre os lados direito e esquerdo pode ser um grande diferencial. Alguns profissionais liberais, como médicos, psicólogos, por exemplo, conseguem notoriedade porque não são apenas técnicos na sua área, sabem comunicar-se com leigos, escrevem para jornais e revistas, dão palestras. Há profissionais que não conseguem se traduzir, só conseguem falar para outros da mesma área.
Mesmo para os artistas, não basta só o talento do hemisfério direito. Picasso e Rodin desfrutaram grande conforto financeiro graças às suas habilidades como negociadores, planejadores, graças ao hemisfério esquerdo. Outros - como Van Gogh, igualmente genial - viveram e morreram na miséria.

A escola ainda que tarde
Volte um pouco no tempo e se lembrará de uma pergunta que atormentou você durante muito tempo. No colégio você quebrava a cabeça com geometria analítica e pensava: vou ser historiador, para que preciso saber isto? Ou: vou ser engenheiro, para que preciso saber sobre os egípcios? Pronto.
Aqui a resposta. Tarde demais, não? Ainda dá tempo. Lembre-se de que o seu cérebro pode se desenvolver até quando você quiser.
Os treinamentos, por favor!
As formas de treinamento são muitas, tantas que, ao final desta reportagem, você estará apto a criar o seu próprio programa de treinamento. Personalizado, só seu!
Vale lembrar que os treinamentos para o cérebro não são divididos por campo de atuação. Ele não funciona por departamentos. Você já leu sobre inteligência emocional, inteligências múltiplas. Mas estas divisões são apenas para efeito didático, para facilitar a compreensão dos mecanismos de pensamento, porque tudo acontece e funciona ao mesmo tempo.
Conheça alguns caminhos e coloque o seu córtex para funcionar!

Esporte na veia
E já que no início fizemos a comparação com o esporte... (Atenção: Não é nenhum complô do meu córtex com o seu córtex para convencer o seu hipotálamo). A prática esportiva é um excelente treinamento para o cérebro. O esporte não treina só o corpo. Eugênio explica que a cada vez que o jogador de basquete vai à quadra para “treinar o braço” em arremessos de três pontos, ou a cada vez que o tenista treina saques, eles estão treinando seu cérebro, que é quem está no comando dos músculos, articulações e ligamentos.
“O cérebro é capaz de interpretar o movimento, avaliar o resultado e corrigir as falhas para o movimento seguinte, incorporando as modificações e automatizando a ação. Quanto mais se treina, mais se incorpora o movimento ao sistema de controle automático do cérebro”, afirma ele.
Antes de mais nada, há comprovações científicas. Eugênio cita uma pesquisa feita nos Estados Unidos que dividiu um time de basquete em três grupos de atletas. O primeiro grupo treinou arremessos longos por 30 dias. O segundo não treinou nada e foi se ocupar de outras coisas. O terceiro grupo não treinou na quadra, mas fez um trabalho de relaxamento e concentração, imaginando que estava nela fazendo arremessos de longa distância. Você imagina qual foi o resultado? O grupo que treinou mentalmente passou a apresentar um índice de acerto muito mais próximo do grupo que treinou na quadra do que o do grupo que não treinou de nenhuma maneira.

Sacada cerebral
Tudo bem, o cérebro é também responsável pelo sucesso dos atletas, mas você não é atleta nem quer saber de esporte, e, só nesta área específica, você concorda inteiramente com o seu hipotálamo. Não é verdade. O treino esportivo exercita o cérebro, desenvolve os conceitos de estratégia, de planejamento, de disciplina. Todos os itens responsáveis pelo sucesso de qualquer empreitada na vida, seja esportiva, profissional (de qualquer segmento), seja pessoal. Até porque, seja qual for a atividade humana, a excelência tem os mesmos componentes. Para ser um excelente cozinheiro, administrador, presidente, coletor de lixo, as qualidades da excelência são as mesmas: foco, criatividade, perseverança, disciplina, flexibilidade, sentimento, inteligência, capacidade de planejar. E todas - absolutamente todas - podem ser treinadas através do esporte.
Quer um exemplo deste vasto poder? Conta-se que um militar americano ficou preso no Vietnã por sete anos. Ao voltar aos Estados Unidos, escreveu um livro e declarou que conseguiu manter a integridade mental porque todos os dias jogava duas partidas de golfe. Golfe no Vietnã? Havia lá um campo em que o militar pudesse jogar?
É claro que não - ele jogava mentalmente. Concentrava-se e mentalizava que estava no campo de seu clube de golfe na América. Lembrava-se dos detalhes do terreno, da posição dos buracos, das árvores ao redor, dos parceiros de jogo, e sentia o peso do taco, o efeito dos movimentos no corpo. Jogava em sua imaginação, mas, ainda assim, jogava.

Qual foi a conseqüência desse treinamento? Quando voltou da guerra, o militar foi jogar golfe e surpreendeu a todos com a qualidade do seu jogo. Claro, havia treinado por sete anos, todos os dias, mentalmente, mas treinava. Este é um exemplo de como o cérebro é treinável, a ponto de afetar diretamente a coordenação motora. E, mais que isso, mostra o poder que o esporte tem como treinador do cérebro: o militar creditou sua sanidade mental ao golfe.


Massagem no cérebro
AE, como se não bastasse, o exercício físico também apresenta benefícios para o cérebro, pois a prática provoca a produção de endorfinas cerebrais, substâncias que provocam sensações de prazer e de relaxamento. Essas ações da endorfina compensam a ação destrutiva da adrenalina provocada pelo estresse, que prejudica a função cerebral. A conseqüência é uma melhora indireta da performance cerebral. “Sob o efeito de doses altas de endorfina, há uma elevação de quatro estados mentais fabulosos: bem-estar, autoconfiança, otimismo e serenidade”, atesta Eugênio.

Corpo que comanda
Vale salientar que este é um exemplo didático (e limitado às poucas descobertas científicas). A questão é muito maior. Não se trata apenas de esportes e movimentos. Trata-se do seu corpo, e não subestime a importância dele.

Há diversos experimentos que indicam que um corpo sadio pode comandar, fortalecer e até mesmo transformar um cérebro. Os atores choram com a ajuda de determinada postura do corpo. Experimente um dia chorar com a postura ereta, o pescoço altivo, os olhos fitando o horizonte. Tente! Ou em um dia de alegria, comece a andar na rua de cabeça baixa e ombros caídos. Em poucos minutos, sem saber por que, você estará desanimado, achando o mundo terrível.
No Japão antigo, os guerreiros samurais eram conhecidos por sua postura firme e desafiadora, que intimidava os inimigos, os quais já entravam na luta derrotados psicologicamente. Os samurais usavam uma faixa elástica chamada kikurigoshi amarrada à bacia. A finalidade da faixa era a de pressionar os ossos da bacia, o que cria um reflexo que passa para a coluna e a deixa mais reta. Não é possível ficar curvado usando o kikurigoshi. A lição é que a mente percebe a postura do corpo e se comporta de modo coerente com ela. “Se você senta de maneira relaxada, o cérebro vai funcionar relaxado. Se você senta sobre os ísquios, com a coluna reta, peito para frente, ombros equilibrados, o seu cérebro vai funcionar assim, majestoso”, diz Eugênio.

Ler com qualidade
Não existe nada mais especular para treinar o cérebro do que a leitura. Aumenta a capacidade de armazenar informações, aprimora a memória, aumenta a compreensão e a associação...
Além de funcionar como um verdadeiro catálogo de maneiras de viver, de encarar os desafios, amplia o vocabulário, a compreensão de mundo. Já imaginou a diferença que faz no cenário atual, feito de relacionamentos e marketing pessoal?
Mas fique atento à qualidade e à diversidade. Na qualidade, o ideal é você pedir indicações de pessoas que você admire e em cujo potencial acredite e, importante, pessoas que conheçam você (a indicação é mais eficiente). Porém, se você já é um leitor assíduo, preste atenção na diversidade. Se você só lê livros da sua área ou do gênero que você aprecia, os resultados não serão tão grandes.
Lembre-se: o cérebro precisa de choques! Procure ler sobre assuntos que você jamais pensou que existissem ou que sejam muito distantes da sua realidade. Alguns exemplos: O livro Carrascos de Paris (Editora Mercuryo), que fala sobre os sansons, carrascos profissionais (remunerados pelo Estado) da Paris do século XIX. Como viviam, como encaravam o ofício. É uma mudança de cenário e foco brutal. Outro: Eva e os Padres (Cia das Letras), que mostra como a mulher era vista pela igreja católica no século XII. Na obra constam textos originais da época, que consideravam todas as mulheres feiticeiras pérfidas, que deveriam, a todo custo, ser contidas. Um tema sobre o qual cabem muitas reflexões e que, se não fosse verídico, seria de passar mal de rir.
Duas qualidades opostas influenciam igualmente as nossas mentes - hábito e novidade. Jean de La Bruyer.

Não precisa, porém, ficar só restrito a temas esdrúxulos. Procure ler sobre assuntos distantes da sua realidade. Por exemplo, se você é profissional da área administrativa, avesso a aventuras, leia O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway. O livro descreve de uma forma incomum o embate entre um velho pescador e o merlim, um dos maiores e mais cobiçados peixes do oceano. Sem contar que é um clássico da literatura mundial, vencedor do prêmio Nobel.
Se você é cartesiano, matemático, formal e nunca leu nada sobre filosofia, não viva sem esta experiência. Neste caso, a recomendação é A felicidade, Desesperadamente (Martins Fontes). É quase um livro de bolso (algo como umas 50 páginas de um livro tradicional), que transcreve uma palestra do filosofo francês André Comte-Sponville sobre a felicidade. O autor, com um didatismo incomum para um filósofo, fala da busca da felicidade com base em vários teóricos do pensamento humano. No final, há a transcrição de perguntas e respostas. Se você achou o título parecido com a auto-ajuda banal do mercado editorial, esqueça! O ‘desesperadamente’ do título é no sentido literal, é “perder a esperança de conseguir”. Além do exercício neuronal, você ainda corre o risco de mudar sua maneira de encarar a vida. Eficientíssimo. 

Feche o livro, abra o livro
Mas, atenção: Maria Inês alerta que é preciso ler e refletir sobre o que foi lido. Se puder discutir com alguém que também leu, melhor. “Se você analisar o que foi lido, você estará tanto armazenando informações quanto ativando a capacidade do cérebro. Se for um romance, coloque-se no lugar do autor e pense de que outra forma a história poderia ter sido escrita. Não é só ler e aceitar passivamente: é desenvolver o raciocínio crítico, a imaginação. É a leitura de qualidade”, explica Maria Inês.
Quando tentamos pegar apenas uma coisa, descobrimos que ela está presa a todo o resto do Universo. John Muir
Livros como A Assustadora História da Medicina (Ediouro) ou A 10 maiores descobertas da medicina (Cia das Letras) ajudam a entender os mecanismos de funcionamento do mundo. Quando você ler um livro destes, o exercício é fazer analogias com as outras áreas. A nossa formação de especialista impede que enxerguemos que tudo faz parte de um todo global, de vermos que tudo está integrado. A assimilação desta verdade faz com que sejamos mais compreensivos e flexíveis.

Homeopatia para o cérebro: todos os dias faça alguma coisa assustadora

Algumas pessoas se queixam de que não lembram mais o nome de ninguém, não conseguem ter uma única idéia nova, não têm motivação para buscar outros interesses... É provável que o seu cérebro esteja com altas dosagens de apatia. Nada de novo acontece e ele começa a se acomodar, a se atrofiar. Quando você perceber que está entrando neste estágio, comece um tratamento de choque. Marque uma data (exceto na segunda-feira - segundo a observação empírica, o cérebro não dá andamento a nada que comece neste dia da semana) e inclua no seu dia uma atitude ou uma ação que assuste o seu córtex. No mínimo ele vai refletir: “Epa! Enganei-me! Está vivo”.
Ele sairá do marasmo, vai levantar a cabeça, olhar para o sistema límbico e dizer: “Você viu isso? O que será?”. Pronto! Você já começa a dar sinais de vida.
Vá capinando aos poucos, sozinho, continuamente. Tente ser melhor todos os dias, em todos os sentidos. Um belo dia você acordará e não se reconhecerá, não reconhecerá o tamanho das suas asas.
Você sabe o que mais me surpreendeu no mundo? A incapacidade da força para criar qualquer coisa. A longo prazo, a espada sempre é derrotada pelo espírito. Napoleão Bonaparte (no fim de sua vida)

Desenvolvendo-se a vida inteira
O cérebro é o único órgão que tem crescimento permanente.
Mas, até que idade é possível desenvolver o cérebro? O estudioso de processos de aprendizagem, Walther Hermann, autor de Domesticando o Dragão e Aprendizagem Acelerada (Editora Madras) afirma que estudos da neurociência atestam que o cérebro cresce ao longo de toda a vida, desde que devidamente estimulado. “Existe no cérebro uma camada de neurônios em estado germinal, que não estão conectados à rede, e algumas atividades liberam no corpo determinados hormônios que fazem com que eles entrem em ação e estabeleçam novas conexões nervosas. Este ‘estoque’ dura a vida inteira”, diz. Walther afirma que há três categorias de fatores que promovem o despertar desta camada em estado germinal.
“A primeira é a curiosidade; é o ‘estar maravilhado’. Pessoas que se deslumbram com acontecimentos, com objetos, com paisagens desenvolvem-se até morrer. Quanto mais vivem, mais sábias se tornam”. A segunda é o estímulo proporcionado pelo ambiente, que nos conduz ou nos força a agir diferente, a pensar diferente. Onde encontrar ambientes assim? Viagens a lugares estranhos a sua cultura e exposições de arte interativa são alguns exemplos. Nas bienais de arte, é possível experimentar instalações nunca imaginadas. Vá, exponha-se, participe da proposta do artista. Este tipo de arte é brinquedo de adulto.
"Sob o familiar, descubram o insólito. Sob o cotidiano, desvelem o inexplicável. Que tudo que é considerado habitual provoque inquietação. Na regra, descubram o abuso. E sempre que o abuso for encontrado, encontrem o remédio” Bertold Brecht
E, por último, os movimentos corporais ou novos padrões de coordenação motora (novamente o corpo). Aprender a pintar, praticar uma arte marcial, um esporte novo que você sempre quis experimentar, tocar um instrumento. Participe destes treinamentos que usam esportes radicais (não se preocupe, não são tão radicais), como rafting, canoiyng e trilhas. Vale tudo. O resumo da ópera é que todos os estímulos que nos proporcionam experiências diferentes liberam os tais hormônios que libertam os neurônios em estado germinal. 

Alta performance até morrer
O.K. Só tem um ponto onde existe um nó: a história de que é possível desenvolver a capacidade cerebral até o fim da vida.Você olha à sua volta e começa a se lembrar do perfil dos idosos que você conhece: falta de memória, comodismo...
“Esta história de que a velhice é uma curva descendente é cultural, não há nenhuma evidência científica”, diz Walther. “Você encontrou muitos idosos ‘finalizados’ porque também para eles foi ensinado que a velhice era decadência e eles entregaram os pontos e pararam de se desenvolver. Parou, deixou de usar, estagnou”, completa.
O cérebro é treinável, inclusive no ‘não-treinamento’. Se você decide que não aprenderá mais nada, você não aprenderá mais nada. Não evoluir significa involuir. Porque ninguém fica igual. Cada um muda de acordo com suas próprias escolhas (às vezes inconscientes). Se você decide não escolher nada, isto também é uma escolha.

Na linha de frente
Eugênio lembra o exemplo da nadadora americana de mar aberto, Florance Chadwick. Ela estava acostumada a grandes travessias. Já tinha cruzado o canal da Mancha em ambos os sentidos, mas falhou quando tentou cruzar a Ilha de Catalina em direção ao continente na Califórnia. Pediu para ser recolhida pelo barco quando estava a apenas 800 metros da chegada. E isso depois de ter nadado mais de 30km! Sabe por quê? Porque era um dia de nevoeiro intenso, e ela não podia ver a costa. Como não podia ver a costa, desistiu e o seu cérebro deixou de lhe fornecer a energia que ela necessitava para seguir nadando, superando a dor, o cansaço e o frio. Quando repetiu a tentativa, com dia claro, não só conseguiu completar a travessia como ainda bateu o recorde em duas horas.
Você já ouviu a máxima de que a medida do homem é a medida dos seus sonhos? Pois é. Leia-se: a medida do homem é a medida do seu cérebro, do que ele permite.
Pode bem ser que, quando não saibamos mais qual é o caminho a seguir, tenhamos começado nossa jornada verdadeira. A mente que não fica perplexa não está sendo usada. O riacho que encontra obstáculos é aquele que canta. Wendell Berry
Enquanto você estiver se surpreendendo e aprendendo, você estará se desenvolvendo. E agora vem um questionamento: você não acha graça em nada. Foi viajar com um amigo e ele, maravilhado, mostrava uma construção diferente, uma árvore linda e você pensava com seus botões ‘que sujeito bobo, parece criança. Não vejo nada demais nisto’.
Um problemão. Como ensinar alguém a ser curioso, a se deslumbrar? Se você está nesta categoria, nem tudo está perdido. Walther afirma que o responsável por isso são os bloqueios e o adestramento cultural, social e religioso. “São eles que intoxicam a compreensão e a percepção”, explica. De acordo com Walther, o caminho a ser trilhado para resgatar a capacidade é o de se surpreender com as coisas e começar a questionar suas crenças, a duvidar das suas verdades e, se possível, livrar-se de algumas. O embotamento pode se originar também do excesso de conteúdo. É preciso romper com o velho para poder enxergar o novo. Segundo Walther, isso não é difícil para o brasileiro, que tem a fama no mundo inteiro pelo seu jeito solto de ser, de coração aberto.
O analfabeto do século XXI não será o indivíduo que não saiba ler e escrever, mas aquele que não conseguir aprender, desaprender e reaprender. Alvin Toffler

Direito ou Esquerdo?
Dê uma nota de 0 a 5 para cada qualidade dos dois hemisférios. A nota deve refletir o que você é e não o que você gostaria de ser. Este levantamento indicará que hemisfério você precisa desenvolver mais e funciona como ponto de partida para o seu desenvolvimento. Portanto... Seja honesto! 

Qualidades do Hemisfério direito

Impulsivo - Você toma atitudes impensadas com freqüência.
Sonhador - Você costuma sonhar muito com um mundo diferente.
Visionário - Você fica imaginando como será o futuro.
Criativo - Você trabalharia em uma agência de propaganda.
Idealista - Você se preocupa com o bem-estar da humanidade.
Excêntrico - Você gosta de ser ou parecer diferente da média.
Emotivo - Você se emociona facilmente vendo um drama no cinema.
Musical - A música sempre transporta você para outros lugares, outros momentos.
Artístico - Quadros e esculturas são muito importantes para você.
Romântico - Você cria momentos especiais para a pessoa que está ao seu lado?
 

Qualidades do Hemisfério esquerdo

Ponderado - Você pensa muito antes de tomar uma decisão
Detalhista - Você precisa de detalhes para entender bem um assunto.
Organizado - Sua mesa, seu ambiente de trabalho estão sempre arrumados, organizados.
Pontual - Você gosta de respeitar e ver respeitados os seus horários.
Controlado - Você mantém a calma em situações difíceis.
Planejador - Você costuma planejar seu dia, sua semana, suas atividades.
Persistente - Você leva tudo até o fim ou tende a desistir.
Matemático - Você tem facilidade com números, índices e gráficos.
Previsível - Você não muda muito de opinião e de humor.
Falante - Você sente grande necessidade de falar. 


Publicado originalmente na revista Vencer! 23 Agosto/2001

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